«Nos últimos tempos, os campeonatos femininos têm vindo a ganhar cada vez maior destaque, quer com o surgimento de projetos em prol da não-discriminação de género quer com a adesão de técnicos bem formados e figuras conceituadas ao futsal em versão cor-de-rosa.
Fala-se, há incontáveis anos, de uma utopia chamada Campeonato Nacional e da reativação das Selecções Nacionais. Diz-se que a solução estará a um mês de distância - veremos o que trará o processo eleitoral que decorre na Federação Portuguesa de Futebol. Mas antes de tudo isso, antes de estruturas e calendários competitivos, creio que urge mudar mentalidades naquela que é a fatia maior das equipas de futsal feminino.
Assistimos em diversos campeonatos à existência de uma ou duas equipas dominantes que se sagram quase religiosamente campeãs, cuja diferença de qualidade é, a todos os níveis, abismal para as demais formações. E o que fazem as demais formações para contrariar esta hegemonia? Infelizmente, na sua quase totalidade, resignam-se. Não é raro ver jogos entre estas equipas dominantes e outras da mesma divisão em que mesmo em desvantagem, o jogo se mantém de sentido único. Defesa nos dez metros, nove, oito, sete ou um. Zona, individual ou mista? Tanto faz, tudo ao molho e fé em Deus. Autocarros nas balizas. Em algumas camiões. Com atrelado, galera, reboque, semi-reboque e afins.
Infelizmente, parece haver um concurso alternativo nos campeonatos, uma espécie de taça de primeiro dos últimos em que quem sofrer menos golos das equipas ditas dominantes ostentará uma faixa de radioso orgulho. Há excepções, é certo, como em tudo. Mas, na sua maioria, permanecem um imobilismo e um comodismo fáceis, um crónico nada-fazer. "As outras são melhores, temos que aceitar e dar-lhes os parabéns". Perdoem-me, mas o tanas!
Apliquem-se, estudem, desenvolvam métodos de trabalho, pensem pela própria cabeça, pressionem alto, joguem com guarda-redes volante. Percam por muitos se for preciso, mas saiam verdadeiramente da quadra com a noção de dever cumprido. Desenvolvam estratégias, estruturas, filosofias, percam (ganhem) tempo a formar jogadoras. Pode sair uma ou outra para um destes clubes dominantes, mas com um bom trabalho o sucesso será sempre estrutural, não apenas conjuntural. Criem culturas de vitória. No fim do dia, isto do futsal vai ser bem mais saboroso.
Mas por ora, enquanto o não conseguem - porque as coisas boas demoram o seu tempo a construir - ponham os olhos no futebol, onde tanto se fala da festa da Taça. Onde em semana de verdadeiros confrontos entre Davids e Golias, os jogadores dos clubes de menor expressão vão diariamente para a cama, cerram os olhos e sonham com o golo impossível, com o festejo exuberante, com o dia de sonho. Bem dizem eles, nada a perder, tudo a ganhar. E não é raro haver os chamados tomba-gigantes. Mas para isso há que fazer pela vida. E não ceder à treta do triste fado lusitano.
Entrar num jogo já com os olhos postos na derrota não é o caminho para o sucesso. É, sim, o caminho para que cada vez mais meninas desistam, porque acham que os seus limites são bem mais terrenos do que realmente o são. É sim para que cada vez menos meninas tenham prazer em jogar futsal - mesmo as dos melhores clubes que ao longo de uma época têm de esperar meses pelos jogos competitivos. É sim para que cada vez menos gente que tanto gosta da nossa modalidade sinta vontade de se deslocar a um pavilhão.
Depois de tomar posse, o ex-Seleccionador Nacional espanhol e agora presidente da Liga Profissional do país-vizinho, Javier Lozano, preocupado com a viabilização do produto "futsal" reuniu com todos os clubes, mas deu especial ênfase àqueles que, ano a ano, se tornaram conhecidos por se fecharem a sete ou oito chaves na defesa. Explicou-lhes que ninguém, à excepção de meia dúzia de pessoas com uma doença chamada clubite crónica, teria interesse em ver jogos de futsal de sentido único. Explicou-lhes que nem os clubes grandes beneficiariam com isso, porque não conseguiriam nunca testar com efetiva eficácia os seus limites. Nunca conseguiriam superar-se.
É esse o desafio que lanço a todos aqueles que dispendem o seu tempo em prol do futsal feminino - embora este repto possa também servir a muitos exemplos que grassam no género masculino - arrisquem! Queiram ter e tenham qualidade! Mesmo sem condições perfeitas ou ideais, superem-se e façam verdadeiramente algo pela modalidade. Sonhem mais alto! Enquanto esperam por decisões políticas que tardam e vão falhando, façam algo que é, no imediato, tangível! Ocupar horas de pavilhão não chega. É preciso exigência e entusiasmo. E esses só surgem quando em qualquer jogo, seja qual for o adversário, se tem pelo menos a ilusão de que afinal, na hora da verdade, quando o árbitro apita, são cinco contra cinco e a bola é redonda. Ou esférica, como os inimigos da poesia desportiva optam por lhe chamar.»
Fala-se, há incontáveis anos, de uma utopia chamada Campeonato Nacional e da reativação das Selecções Nacionais. Diz-se que a solução estará a um mês de distância - veremos o que trará o processo eleitoral que decorre na Federação Portuguesa de Futebol. Mas antes de tudo isso, antes de estruturas e calendários competitivos, creio que urge mudar mentalidades naquela que é a fatia maior das equipas de futsal feminino.
Assistimos em diversos campeonatos à existência de uma ou duas equipas dominantes que se sagram quase religiosamente campeãs, cuja diferença de qualidade é, a todos os níveis, abismal para as demais formações. E o que fazem as demais formações para contrariar esta hegemonia? Infelizmente, na sua quase totalidade, resignam-se. Não é raro ver jogos entre estas equipas dominantes e outras da mesma divisão em que mesmo em desvantagem, o jogo se mantém de sentido único. Defesa nos dez metros, nove, oito, sete ou um. Zona, individual ou mista? Tanto faz, tudo ao molho e fé em Deus. Autocarros nas balizas. Em algumas camiões. Com atrelado, galera, reboque, semi-reboque e afins.
Infelizmente, parece haver um concurso alternativo nos campeonatos, uma espécie de taça de primeiro dos últimos em que quem sofrer menos golos das equipas ditas dominantes ostentará uma faixa de radioso orgulho. Há excepções, é certo, como em tudo. Mas, na sua maioria, permanecem um imobilismo e um comodismo fáceis, um crónico nada-fazer. "As outras são melhores, temos que aceitar e dar-lhes os parabéns". Perdoem-me, mas o tanas!
Apliquem-se, estudem, desenvolvam métodos de trabalho, pensem pela própria cabeça, pressionem alto, joguem com guarda-redes volante. Percam por muitos se for preciso, mas saiam verdadeiramente da quadra com a noção de dever cumprido. Desenvolvam estratégias, estruturas, filosofias, percam (ganhem) tempo a formar jogadoras. Pode sair uma ou outra para um destes clubes dominantes, mas com um bom trabalho o sucesso será sempre estrutural, não apenas conjuntural. Criem culturas de vitória. No fim do dia, isto do futsal vai ser bem mais saboroso.
Mas por ora, enquanto o não conseguem - porque as coisas boas demoram o seu tempo a construir - ponham os olhos no futebol, onde tanto se fala da festa da Taça. Onde em semana de verdadeiros confrontos entre Davids e Golias, os jogadores dos clubes de menor expressão vão diariamente para a cama, cerram os olhos e sonham com o golo impossível, com o festejo exuberante, com o dia de sonho. Bem dizem eles, nada a perder, tudo a ganhar. E não é raro haver os chamados tomba-gigantes. Mas para isso há que fazer pela vida. E não ceder à treta do triste fado lusitano.
Entrar num jogo já com os olhos postos na derrota não é o caminho para o sucesso. É, sim, o caminho para que cada vez mais meninas desistam, porque acham que os seus limites são bem mais terrenos do que realmente o são. É sim para que cada vez menos meninas tenham prazer em jogar futsal - mesmo as dos melhores clubes que ao longo de uma época têm de esperar meses pelos jogos competitivos. É sim para que cada vez menos gente que tanto gosta da nossa modalidade sinta vontade de se deslocar a um pavilhão.
Depois de tomar posse, o ex-Seleccionador Nacional espanhol e agora presidente da Liga Profissional do país-vizinho, Javier Lozano, preocupado com a viabilização do produto "futsal" reuniu com todos os clubes, mas deu especial ênfase àqueles que, ano a ano, se tornaram conhecidos por se fecharem a sete ou oito chaves na defesa. Explicou-lhes que ninguém, à excepção de meia dúzia de pessoas com uma doença chamada clubite crónica, teria interesse em ver jogos de futsal de sentido único. Explicou-lhes que nem os clubes grandes beneficiariam com isso, porque não conseguiriam nunca testar com efetiva eficácia os seus limites. Nunca conseguiriam superar-se.
É esse o desafio que lanço a todos aqueles que dispendem o seu tempo em prol do futsal feminino - embora este repto possa também servir a muitos exemplos que grassam no género masculino - arrisquem! Queiram ter e tenham qualidade! Mesmo sem condições perfeitas ou ideais, superem-se e façam verdadeiramente algo pela modalidade. Sonhem mais alto! Enquanto esperam por decisões políticas que tardam e vão falhando, façam algo que é, no imediato, tangível! Ocupar horas de pavilhão não chega. É preciso exigência e entusiasmo. E esses só surgem quando em qualquer jogo, seja qual for o adversário, se tem pelo menos a ilusão de que afinal, na hora da verdade, quando o árbitro apita, são cinco contra cinco e a bola é redonda. Ou esférica, como os inimigos da poesia desportiva optam por lhe chamar.»
Texto: Francisco Fardilha (Treinador de futsal)
Fonte: www.futsalglobal.com